Quase - Antônio Cícero

Quase  

Por uma estranha alquimia

(você e outros elementos)

Quase fui feliz um dia.

Não tinha nem fundamento.

Havia só a magia

Dos seus aparecimentos

E a música que eu ouvia

E um perfume no vento.

Quase fui feliz um dia.

Lembrar é quase promessa,

É quase, quase alegria.

Quase fui feliz à beça

Mas você só me dizia:

"Meu amor, vem cá, sai dessa".

Quero escrever um livro chamado "O feminino de bicho"

     Para concorrer a um Oscar, não sei que conseguiu acompanhar os relatos de Fernanda Torres neste processo, ela diz que há uma corrida de apresentação do filme em universidades, em festivais, em lugares determinantes para primeiro fazer o filme ser conhecido, depois outra corrida para tentar chegar até os votantes do prêmio que são dezenas ou centenas (não lembro bem) espalhados por países específicos. 

      Antes de trazer meus levantamentos sobre o filme que conta a história do Ney Matogrosso, a fala que gostaria de começar este texto, foi retirada de uma dessas entrevistas que a Fernanda Torres deu falando sobre o Brasil:

O Brasil é uma ilha continental e a gente é isolado pela nossa língua, ao mesmo tempo a gente consome a nossa própria cultura. a gente tem total interesse por nós mesmos. Porque somos uma potência de 200 milhões de pessoas, nós somos um país complexo. A gente não é um país periférico, a gente tem as nossas próprias questões. Outro dia conversando com a Daniela Thomas, Engraçado né? porque eu conheço a cultura francesa, eu conheço a cultura americana. Eu conheço a cultura russa, a cultura alemã, a cultura italiana. Mas eles não conhecem a cultura brasileira muito, e as vezes eu tenho pena de quem nunca leu Machado de Assis, de quem não conhece o Eça de Queiroz. Agora as pessoas descobriraram a Clarice Lispector e escrevem assombradas. Como posso falar com alguém que não sabe quem é Nelson Rodrigues. Que não sabe quem é Candeia, não sei?! Então, ao mesmo tempo que o Brasil tem esse complexo de vira-lata dessa não comunicação com o mundo. Por outro Lado o Brasil tem pena do mundo não saber do que a gente sabe. Quando alguém fura a fronteira e leva algo que nos é pessoal para fora. É essa especíe de sentimento de "OLHA O QUE A GENTE TEM DE RICO" é um sentimento de orgulho nacional bacana, bom de sentir.

        Deste fragmento supracitado, eu gostaria de destacar, a gente tem pena do mundo. Eu tenho pena do mundo que nunca vai ser capaz de entender a ancestralidade, a força da matriz africana por traz da cena que inicia o filme do Ney. A sensibilidade do menino que, escuta a natureza, quer ser bicho. Há uma entrega do Jesuíta Barbosa para além da vaidade, do enquadramento perfeito que vai valorizar seu ângulo. Não. É apenas entrega de alguém que merecia todos os reconhecimentos internacionais possível que jamais chegaram. E reafirmo, eu tenho pena do mundo. 

        Como professor de português para estrangeiros, eu poderia explicar, poderia exemplificar, mostrar os orixás, dizer sobre a ancestralidade que reina em todos os brasileiros sem mesmo terem essa religião como guia, mas não teria sucesso. O aluno mais afetuoso pelo Brasil só conseguiria dizer "interessante", como disse uma vez o professor José Geraldo: Não tenho como discutir com a deputada porque a sua visão de mundo, a sua percepção só lhe permite enxergar o que já tem escrito na sua cognição. A senhora não vai ver o que existe, mas o que a senhora recorta da realidade.


    Foi uma surpresa boa, depois da decepção que foi o filme da Gal. Saí de lá com duas motivações muito fortes. Na verdade três, mas acho que só consigo declarar duas publicamente. 1. quero escrever um livro chamado "o feminino de bicho", e em seguida, 2. quero o corte da barba do ex marido do Ney o Marco de Maria, que foi companheiro de Ney por 13 anos, e, que no filme é interpretado por Bruno Montaleone. 


        Para encerrar os recortes pessoais e este texto, também foi forte demais para mim, ver o Ney assumindo o sobrenome do pai que não recebeu como seu nome artístico. Uma vez pedi uma certidão de nascimento ao meu pai e chegou até mim um envelope com a certidão dobrada dentro com o nome em letras garrafais do lado de fora "Bruno Oliveira" (o sobrenome da minha mãe). Lugares em que a arte só atinge a gente, apenas atinge lugares que estavam ali no esquecimento. Eu não seria o menino que aguentaria apanhar do pai sem chorar, eu tentaria porque eu sou orgulhoso para o desafio, mas eu nunca soube ser tão forte assim. Mas também assumi o sobrenome do meu pai para falar de minhas gayzitudes.

 





maio que ainda está por vir

    Hoje, um coletivo periférico aqui de campinas anunciou uma oficina de poesia que desenvolvi sobre a favela. E ando com vontade de começar a falar sobre corpo, música e palavras chulas. Iniciar uma poesia enaltecendo "Dako é bom" Tati Quebra-barraco. Essas manifestações do cotidiano que passam pela oralidade, sempre me soaram tão lindas, porque, pra mim, a poesia está em tudo que respirando inclusive numa passarela da Avenida Brasil, ali discreta sem muito alarde. Por isso o nome: as coisas consideradas sem ênfase. (uma referência a Drummond, claramente).


    O mês de maio tem sido um mês de medos, anseios e movimentações. Abril foi inexistente, não consegui movimentar minha dissertação, mas agora medicado, estou com mais esperanças. Como sempre opero em beira de burnout, também consegui a capa final do meu projeto de livro de "baixarias & situações vulgares". Adendos: nunca pensei que fosse tão custoso imprimir um livro dentro de sua própria casa. Mas minha dose de poesia marginal de apenas 100 tiragens está em fase final. 


    Regis, não faz ideia. O leitor da flor (segue foto abaixo), mas ele receberá a cópia 02. A primeira foi prometida ao André, aquele que colocarei para me ajudar a costurar livros e não sabe a furada que está se metendo. É o preço de ter a cópia número 01 de um livro artesanal feito à mão na impressora de casa. Mas do fundo do coração espero que todos os amigos que receberem o livro guardem com afeto um material idealizado do início ao fim para uma experiência.


Por fim, notas para o Bruno do futuro que deixou de ir ao show da Lady Gaga por consideração à uma amiga vacilona, você não para de ouvir Vanish into you. Esses quatro anos foram difíceis na UNICAMP, mas você nunca mais será o mesmo. Obrigado a todos que em vida não pude agradecer e nunca saberia por em palavras o tamanho do meu amor. Como um personagem Clariciano com pitadas de Novos Baianos, eu transbordo amor da cabeça aos pés. 




Valéria Coelho - Belém

 

"Daqui, em 1976, acenei para você" é uma frase que foi incluída no prédio do Solar da Beira, em Belém, no Pará, em meados de 2010. A frase foi parte de uma intervenção urbana da artista Valéria Coelho para o Arte Pará de 2010. O objetivo era transcrever as memórias dos locais. 

 Ultimamente, só eu sei o que ando sentido com a aproximação do fim deste mestrado. Vivendo intensamente síndrome do impostor sem ter com quem dividir essa angústia concentrada. Penso demais num recorte de tantos vídeos de Fernanda Montenegro falando sobre o globo de ouro da filha, em um dos comentários dela. Ela celebra que a filha estava recebendo uma premição sobre sua carreira de atriz que ela tanto se questionou, uma vez que Fernanda Torres tem uma carreira de escritora (crônista) reconhecida em número de vendas e crítica. Aos 59 anos chegou seu reconhecimento como atriz. Não sei se quero esperar o reconhecimento da carreira beirando os 60 anos, a vida é "tão laminha". Sobreviver e se reconstruir até o reconhecimento vir? Curiosamente, meu novo livro vem aí. Sem o mesmo reconhecimento de alguns amigos na mesma labuta que a minha. Livro com carinho, e autencidade, talvez com vergonha alheia futura, mas a meta é produzir e depois repensar.

    Esses dias ajudei um ator a construir um personagem chamado Danilo, que vive com HIV e foi rejeitado pelo namorado. Me senti feliz por contribuir e sentir que tenho muito a dizer às pessoas. Mas infelizmente ainda ando recalculando vida, recalculando medos, recalculando dores. Sem ter para quem dividir o que será da minha vida, onde será minha vida, onde que eu vou descansar meu medo do fracasso.  Que nunca me falte coragem.

                                                (rascunho de projeto gráfico para o ilustrador)

Cartão Postal - Rita Lee

 "Pra que sofrer com despedida

Se quem partir não leva nem o sol, nem as trevas

E quem fica não se esquece tudo o que sonhou?"




Angustiante na música "O Ciúme" de Caetano quando ele diz: "Mas na voz que canta tudo ainda arde. Tudo é perda, tudo quer gritar, cadê?"ainda na música: "O ciúme lançou sua flecha preta e se viu ferido justo na garganta".

A leitura do Biden na despedida: “uma oligarquia dos homens mais ricos assumindo a presidência dos EUA”