O homem da sua vida inteira.



Hoje não sou mais o homem da vida inteira de minha mãe, hoje brigamos e tentamos manter um diálogo como civilizado que somos, ou tentamos ser. Não é difícil afirmar: hoje não sou mais seu homem. Hoje não sou homem de ninguém. Senhor de cachos que emaranham ideias confusas a cerca de inúmeras sensações que no fim terminam numa prolixidade sem forma nem conteúdo.

 O meu processo de escrita começou tardio. Eu tinha acabado de sair de casa, ainda entendendo o quê aconteceu, dias antes, que motivará minha mãe tomar tal atitude. Escrevia olhando para minhas coisas amontoadas pela casa de minha avó. Reafirmo, naquele tempo escrevia sobre coisas confusas que se misturavam entre os carinhos e muitos mimos de quem mora com vó. Só me entendia como um ser capaz de balbuciar coisas sem sentido, sem coesão e sem sintaxe.

Entre estudar para uma prova que pode mudar minha vida, stalkeio fotos de Instagram de gente que aparentou ser homem da vida de alguém. Sou capaz de proporcionar tal sensação a alguém? Quase que automaticamente diria não. Trago na bagagem três relacionamentos relativamente longos, mal acabados e nada publicado em jornais, revistas ou em fotos de Instagram. 
                   
Para quem um dia sonhou em reinar uma terra de tartuguitas sem cabeças, degustadas por mim, é lógico. A resposta que de alguma forma consigo formular soa um pouco triste. Mas, para quem num domingo de dia das crianças está lendo um texto teórico com uma análise da formação do romance moderno, acredito até que a resposta seja satisfatória. Em todo caso, se algum dia eu me ver no instagram de alguém, como sinônimo de felicidade, mesmo que com o pensamento distante, fotografado na primeira distração, confesso: estarei preparado.

Apaixonado

Saquei minha calma
Expressei minha alma
Abaixei a guarda
Atentei as suas causas.
Mas você não sacou nada
e, te assustei com minhas armas.

Sou um mestre Pokemon, lidem com isso.



Existem duas formas básicas para um texto de temática gay viralizar na internet. A primeira é a mais fácil; eu começo a falar da doentia desordem comportamental em busca da beleza e perfeição do mundo das minorias praticantes de sexo homoafetivo; A segunda é deixar claro que nunca pertenci a nada referente ao mundo gay e que entrei para um clã místico de pessoas que “escolheu esperar”, e que portanto nunca sequer baixou um aplicativo de “pegação”, mas que já ouvi vários relatos de amigos, e justamente por isso, resolvi relatar a crueldade daqueles que são rejeitados na desordem do mundo gay.

        Visto essas opções, optei por deixar as duas formas supracitadas de lado, e escolhi por uma outra forma a que me divertiria mais: falar sobre Giovana. Afinal, eu e ela temos muito em comum, além de um “forninho” prestes a cair sobre nossas cabeças. Eventualmente todos crescemos e sentimos a necessidade de expressarmos nossa sexualidade. Eu cresci tardiamente enquanto Giovana virou mais que um hit de internet, ela cresceu sem nem atingir sua menarca e canta lindamente: “desce, sobe, empina e rebola e tenta ser toda delícia, toda gostosa”. Eu só fui largar as roupas coloridas de criança, deixar a barba crescer e trocar a armação dos óculos quando me toquei, aos 25 anos, que tinha me tornado adulto e estava inserido num “mercado” de pessoas solteiras de novo.

Depois que terminei meu último relacionamento, acho que demorei uns sete meses, para ter coragem de entrar num site de relacionamento gay novamente. E, nesse momento estava eu, com vergonha de mostrar a cara, com uma foto trajando uma máscara azul do Homem de Ferro. Não durei um mês naquele site. Não foi por falta de convites para sexo ou para conversar. Foi por uma coisa mais intensa que nunca tinha sentindo até então. E, se sem mais ou do nada uma frase do Machado de Assis ecoasse forte em cada perfil que chegava a me mandar alguma mensagem, de maneira que eu sentia medo de ser rejeitado, de não ser minimamente interessante. A frase era “Capitu era muito mais mulher do que eu era homem”. Isto é, o problema não era nos outros, era em mim. 

Lembro que cheguei a explicar a algumas pessoas que não era falta de interesse de minha parte, e bem direto dizia que achava seus perfis sexy até, mas era eu que não era o exemplo de sexualidade o suficiente para atraí-los. Talvez por ser nerd ou apresentar referências da Marvel, Ocarina of Time ou AC/DC, aparentemente, eu me tornava mais agradável e por isso despertava o interesse dos perfis. E, acho que isso atraia as pessoas. (Por aparentar ser “bem-menininho”) essa atenção me levou a crer que em algum momento desse século as pessoas começaram a achar legal ser estranho e gostar de coisas “inteligentes”. Eu queria ser legal? Confesso que queria, mas eu não preenchia o requisito de masculinidade ou de feminilidade, mesmo quando minha inteligência era vista como prioridade diante dessa dicotomia, ainda assim sabia que mais cedo ou mais tarde, a aparência iria contar mais. A ficha caiu que, ao menos para estar bem cotado nesses sites, boates, aplicativos - afirmaria que pra ser gay – é preciso exceder-se no estereótipo do másculo ou do feminino.

Por mais que atualmente inúmeros sites foquem no universo gay tentando o tempo inteiro dizer que você pode ser quem você quiser, “Cause you were born this way, baby”, a minha impressão é que o imaginário sexual deste universo vai sempre te exigir um ou outro; o masculino-homem-viril ou o afeminado-que-precisa-de-proteção, pronto para vestir uma calcinha caso necessário. E, sinceramente eu não preencho nenhum deles, eu sobrei. Não que fosse vergonha entrar em um ou outro, pois afinal feliz é aquele que sempre se enquadrou. Quem nunca disse que era hétero numa roda de colegas/conhecidos para ser aceito? Seja na adolescência ou no bate-papo UOL quando afirmamos: “sou discreto”. Por mais que tentem negar, existe uma vontade de enquadramento em cada um de nós.

Meu maior problema está em não saber ser sensual, e nem preciso confessar que eu não sei combinar blusas sociais feitas por lojas de estampas alternativas - até uns meses atrás, eu era o que comprava roupas em lojas de departamento no final do ano pra ficar bonitinho no natal – já sendo tão “tragicômico” como Geovana tentando ser sensual, também não levo jeito pra música. No máximo, vocês vão conseguir me ver postando algo desagradável em fotos da Katy Perry como: “Sai dae sem grammy”. Ou seja, um torto na vida. Torto por não estar nem ai para as brigas entre as divas do pop, mas implicante o suficiente para cutucar aqueles que se importam. Eu sobrei, e sobrei pra implicar.




Como se não bastasse ter que ser bom/combinar no sexo, no beijo, no carinho é preciso corresponder às expectativas também no quesito masculinidade. Por isso, diria que esse é o maior motivo pelo qual, a maioria dos meus amigos estão solteiros. A gente só quer saber de ser conquistado, mas o que fazemos quando o período da conquista acaba? Eu vejo o tempo inteiro amigos e amigas querendo e desejando conquistas e juras de amor eterno. Entretanto, sem se darem conta que nem tudo é só conquista, sedução, que mais cedo ou mais tarde receberemos rotina em troca. E, não pensem que o fim da conquista é uma via de mão única, acaba acontecendo por ambas partes. Me parece bastante injusto quando nos filmes da Disney, os quais crescemos assistindo, só abordam o príncipe com hálito de bala halls acordando a Branca de Neve. O fato é que estamos condicionados à sedução, numa busca romântica por uma perfeição que só existe em nossas cabeças. Não é fácil conhecer alguém ciente de que a qualquer momento aquela sensação, de querer estar perto ou de ser agradável com o outro acabará em breve. E mais difícil ainda, encontrar alguém disposta a permitir que você entre na rotina dela num compromisso.

Tornar a rotina do outro presente na nossa, ciente de que um dia esse(a) parceiro(a) pode acordar descabelado(a) ou com bafo, só piorar a situação. Já imaginou que talvez a pessoa que você conheceu no Tinder pode não se parecer com aquela imagem bonita, sob a luz e o ângulo certo, o tempo inteiro? É desagradável mesmo, mas cedo ou tarde a gravidade ou o tempo trata de tirar aquela barriguinha tanquinho, mas pense positivo! Fica o que você construiu durante a relação, e isso está além da beleza. Por isso, conhecer alguém ciente que perderemos “a conquista” e transforma-la numa relação - num tratado de companheirismo - é muito difícil, ainda mais quando, frequentemente, aquele comercial da OLX, entre o horário da novela das nove e as madrugadas de sábado, está jogando na nossa cara que ter uma vida na rotina é inaceitável. 

É por toda essa idealização de amor perfeito que ando com uma preguiça pra gente que acha que o príncipe encantado vai chegar a qualquer momento, num cavalo branco, e dizendo que vai preencher todas as suas lacunas de insegurança e ainda vai falar inglês e te levar pra conhecer a Europa. Sobre minha experiência no site de relacionamento, até cheguei a conhecer alguém com quem pensei seriamente em ter algo sério. Meu gosto por ele, só cresceu por dividir comigo suas formas de encontrar Deus, de como ele admira a lua ao meio dia quando ninguém mais liga pra ela no céu claro. Mas eu não fazia o tipo dele, não por ele curtir mais Kill Bill, e eu Death Proof, mas por eu ser menos homem que ele, por eu gostar de jogar meu DS ao invés de assistir Games Of Thrones. Acontece!

Por essas e outras, a gente volta pra roda, e tenta de novo, numa outra hora, num outro lugar. Cientes que é de onde menos esperamos que encontraremos forças para segurar o forninho que está prestes a cair.  Sempre a espera de alguém pra ajudar, ciente do mais famosos dos clichês “que é preciso muito mais que; ser sexy ou ter só mais um rosto bonito”. Antes de qualquer coisa é importante sempre lembrarmos: Valorize aqueles que aparentam mais preocupados com o que sentimos e desejamos. Portanto, voltando para o tema do texto, para ser um Mestre Pokemon é preciso coragem, paciência e um Mega Alakazam, pois de repente crescer e não ter uma arma pra enfrentar o mundo gay e suas peculiaridades vem se tornando cada vez mais difícil.