Hit de Machado de Assis

 

[1] Você sabia que Machado de Assis não está “hitando” pela primeira vez nos EUA? Na pandemia o livro Memórias Póstumas de Brás Cubas ganhou uma tradução nova e durante meses ficou na lista dos livros mais vendidos.


 [2] Foi o momento mais legal de acompanhar os booktubers gringos que o chamavam de “Wizard of Catete”, mas sabe que Machado é um escritor não muito apreciado por professores de português também? Esses dias estava debatendo com professores na escola que trabalho

[3] Alguns diziam: “tive que ler na escola foi traumatizante, detestei” outro disse “não entendi nada, agora estou relendo”. Essa discussão começou por causa da repercussão do vídeo da escritora americana lendo clássicos mundial.

[4] Rapidamente eu retruquei: Mas ao mesmo tempo se a escola não cobrar em que momento a gente vai conhecer Machado? Às vezes, eu tenho a sensação de que se a gente não cobra a escola falha, se a gente cobra cria traumas. A culpa sempre é da escola.

[5] Gostaria de aproveitar o espaço pra dizer que a maioria dos professores de português que temos, na escola, detesta literatura. E quando a gente tem sorte de conhecer um professor que sabe o que tá falando, consegue passar de verdade o que aquele texto significa.

[6] Para vender o livro para adolescentes a gente precisa dizer que o texto de Brás Cubas “é a história de um defunto falando da sua morte”, pura balela. Ele só é um brasileiro, medíocre, dramático, lixo. (Talvez seja um canceriano, minha avó também dedica seus restos aos vermes que lhe dão atenção)

[7] Uma vida inteira de frustração até a mulher que ele desejava só via ele como um corpo para transar. Uma rola para o prazer, um lixo para se ter como marido. Infelizmente, é o retrato do brasileiro todinho.

[8] Brás admira o tio porque faz coisa errada, inclusive o leva para perder a virgindade num puteiro. Menospreza o pai por ser uma pessoa boa. A família ficou rica com trabalho desonroso, recuperando escravo perdido. Tudo na família Brás é uma tentativa de pertencer a uma elite, mostrar poder, mostrar que tem grana.

[9] Um brasileiro medíocre que não gosta de estudar, não se esforça para nada que preste, não tem admiração de ninguém porque como sociedade, também não fazemos questão, de sermos nada além de aparências. O mais triste é nossa constante necessidade de mostrar que somos melhores que os descendentes de escravos desse país.

[10] Brás Cubas é um Brasil do século 19, que mostra quem é essa classe média medíocre que temos hoje. Brás é o bolsonarismo, que está empenhado em mostrar que é muito diferente dos mais pobres, dos mais simples desse país, uma tentativa constante de tentar aparentar classe dominante a partir da mediocridade e malandragem. É um Brasil que tá ai "desde tempos imemoriais"...

Na cama - Angela RoRo




"Manchar a sua boca
até você me tatuar
e berrar que me ama
na cama, na cama
meu corpo voltou a se agitar
na cama." 
 

Liniker - Bodyguard (COVER)


 

They couldn't have me (aah), and they never will

And sometimes I hold you closer just to know you're real (aah)

Wheels in the gravel, Davis in my bones

Sometimes I take the day off just to turn you on

Oh, oh, oh

 

Honey, honey, I could be your bodyguard (hey)

Oh, honey, honеy, I could be your Kevlar (uh)

Oh, honey, honеy, I could be your lifeguard (hey)

Ooh, honey, honey, you should let me ride shotgun, shotgun

Oh, oh, oh


Pluie (Chuva) Francis Ponge - Tradução Bruno Couto


 

    A chuva, no quintal onde a observo cair, desce em velocidades muito diversas. No centro, é uma cortina fina (ou rede) descontínua, uma queda implacável mas relativamente lenta de gotas provavelmente bastante leves, uma precipitação perpétua sem vigor, uma fração intensa do meteoro puro. Um pouco mais distantes das paredes da direita e da esquerda, caem com mais barulho gotas mais pesadas, individualizadas. Aqui parecem do tamanho de um grão de trigo, ali de uma ervilha, em outro lugar quase de uma bolinha de gude. Nas hastes, nos braços da janela, a chuva corre horizontalmente enquanto na face inferior dos mesmos obstáculos ela se suspende em gotículas convexas. De um pequeno telhado de zinco que o olhar domina, ela escorre em uma camada muito fina, iridescente devido a correntes muito variadas pelas imperceptíveis ondulações e saliências da cobertura. Da calha adjacente onde flui com a contenção de um riacho raso sem grande inclinação, ela cai de repente em um fio perfeitamente vertical, grosseiramente trançado, até o chão onde se quebra e ressalta em fios brilhantes. Cada uma de suas formas tem uma aparência particular; a cada uma corresponde um som particular. O todo vive com intensidade como um mecanismo complicado, tão preciso quanto aleatório, como um relógio cuja mola é a gravidade de uma massa dada de vapor em precipitação. O som no chão das redes verticais, o gorgolejar das calhas, os minúsculos golpes de gongo se multiplicam e ressoam ao mesmo tempo em um concerto sem monotonia, não sem delicadeza. Quando a mola se solta, algumas engrenagens continuam a funcionar por um tempo, cada vez mais lentamente, e por fim toda a maquinaria para. Então, se o sol reaparecer, tudo desaparece logo, o brilhante aparelho se evapora: choveu.